Emprego voltou a subir em 2021, mas com menor renda e avanço da vulnerabilidade

A pandemia fez o Brasil fechar 11,3 milhões de postos de trabalho num país que já tinha 12 milhões de pessoas sem emprego em março de 2020, antes de o coronavírus se espalhar por aqui, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Em 2021, mesmo com um cenário tenebroso de infecção no primeiro semestre, as coisas melhoraram levemente – graças à vacinação e à retomada das atividades que ela proporcionou. A quantidade de ocupados se elevou para 90,2 milhões em setembro (após cair para 82,5 milhões um ano mais cedo). Mas, mesmo assim, ainda temos 3,6 milhões de vagas a menos que antes da pandemia.

Vai ter vaga para toda essa gente em 2022?

“Não. Com a inflação aumentando, a massa de rendimentos caindo, a indústria produzindo menos, o comércio vendendo menos. Então, no ano que vem, sem uma retomada da economia, dificilmente recuperaremos todas essas vagas perdidas”, afirma Hélio Zylberstajn, professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (USP).

Salários menores

Poderemos, entretanto, recuperar parte delas. O problema, como explica Zylberstajn, é que para várias das vagas que estão surgindo agora — e que serão abertas no ano que vem — oferecem salários menores. A massa de rendimentos, ou seja, a renda média dos trabalhadores, vai continuar caindo como já vem caindo drasticamente em 2021. Atualmente, ela é 11,1% menor que no terceiro trimestre de 2020, segundo o IBGE.

A expectativa de Luiz Guilherme Schymura, diretor do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre) também vai nessa linha.

“O padrão pré-pandemia de expansão do trabalho mais vulnerável parece se reafirmar em 2021, comparando o 3º trimestre deste ano com o de 2019. Não se enxerga no horizonte, infelizmente, um cenário em que o mercado de trabalho passe a criar empregos de qualidade, bem pagos e seguros”, diz em publicação recente, cujo título é “a armadilha da criação de empregos de baixa qualidade e alta vulnerabilidade”.

Esse é um dado que a assistente administrativa Cláudia Mendes, de Campinas, está vendo de perto. Em setembro, ela perdeu o emprego que tinha há 12 anos. “Tenho feito vários processos seletivos online e vejo que os salários estão menores. Coisa de 10%. Ou, às vezes, eles são nominalmente iguais, mas os benefícios são muito poucos. No fim das contas, fica tudo igual, nivelado por baixo”, diz ela.

Esse esmagamento dos rendimentos do trabalhador pode, de alguma maneira, afastar parte das pessoas que estão em busca de um emprego. Embora não seja o caso da maioria, esse conjunto de trabalhadores se recusa a aceitar uma vaga com salário menor.

“É o que a gente observa internacionalmente, nos países que estão mais avançados na recuperação pós-pandemia. Por vários motivos, muitos deles ainda não bem conhecidos, uma parte dos desempregados deixa de procurar emprego. Isso pode acontecer aqui também no ano que vem”, diz Natalie Victal, economista da Garde Asset Management.

De certa forma, é o que está acontecendo com Cláudia. Em sua busca por uma nova vaga, ela vem recusando essas oportunidades com salários menores.  “Coloquei uma data limite no ano que vem: se não achar nada melhor até lá, aí mudo de estratégia”, afirma ela.

Essa desistência – mesmo que temporária – de alguns candidatos, mais uma esperada recuperação do setor de serviços – que é tradicionalmente o que mais emprega, em comparação com a indústria e a agricultura – podem fazer os índices de desemprego em 2022 ficarem menos ruins.

O setor de bares e restaurante, por exemplo, já vem apresentando uma leve recuperação. Durante os meses de quarentena, em que esse tipo de comércio precisou fechar, operar só com entregas ou horários reduzidos, foram demitidos 1,2 milhão de trabalhadores de um total de 6 milhões de empregados. Mas desde a reabertura – com a imunização se expandindo – a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) calcula que 600 mil postos de trabalho serão recuperados até o fim de 2021. No ano que vem.

Mas, como disse Zylberstajn, dificilmente criaremos novas vagas. Será uma recuperação em parte do que já foi perdido. “O Brasil vem repelindo investimentos em vez de atrair”, diz Zylberstajn. A ameaça ao teto de gastos e a crise energética são os dois fatores que mais assustam os investidores, que tiram ou acabam deixando de investir seus dólares aqui. Em 2021, o investimento estrangeiro no Brasil atingiu pior patamar dos últimos 12 anos, com uma fuga superior a US$ 24 bilhões, segundo dados da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), ligada às Nações Unidas, divulgados em agosto.

E isso faz o real desvalorizar. Com o dólar mais caro, sobe o preço dos combustíveis, há mais inflação, menos vendas – o que deixa a recuperação da economia bem mais lenta.

A esperança fica por conta de um arrefecimento na crise hídrica, com chuvas acima da média no início do ano. Com isso, as bandeiras tarifárias devem ser menos drásticas. Contas de luz menores podem estimular a atividade econômica, principalmente – como já citamos – o setor de serviços: cabeleireiros, lojas, restaurantes, etc.