A calamidade e o transporte intermunicipal

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Romélia Ribeiro Peron

O transporte coletivo de passageiros entre os 141 municípios de Mato Grosso é, até hoje, na sua maior parte, operado por empresas legatárias de empresas pioneiras, que aproveitaram a oportunidade da expansão territorial na década de 80 e instalaram-se no estado, contribuindo para seu crescimento.

A Constituição Federal de 1988 determinou que a prestação de serviços públicos, como o de transporte de passageiros municipal, intermunicipal, interestadual de passageiros seja, na forma da lei, realizado diretamente pela administração pública ou por meio de particulares, sempre por meio de licitação.

O que grande parte dos cidadãos mato-grossenses desconhece é que, como a maioria dos estados brasileiros, Mato Grosso luta contra a burocracia e interesses diversos para fazer cumprir a ordem constitucional e possuir, enfim, contratos que permitam a efetiva regulação das empresas que prestam o serviço de transporte intermunicipal.

No ano de 2012, após estudos técnicos liderados pela Fundação Ricardo Franco, ligada ao Instituto Militar de Engenharia – IME, edição de leis e decretos regulamentares, Mato Grosso lançou o primeiro edital da licitação para outorgar a concessão dos serviços de transporte intermunicipal de passageiros – Concorrência Pública n. 01/2012 iniciada pela Agência de Regulação do Estado de Mato Grosso – AGER/MT.

Muitos são os obstáculos e dificuldades para execução da licitação e cumprimento da ordem constitucional. Os prazos legais, a alternância de Governos, a complexidade do projeto e, nesses tempos de Lava Jato, claro, corrupção, como consta em delação de um ex-governador, que trouxe a promessa de pagamento de R$ 6.000.000,00 (seis milhões de reais) para embaraço do procedimento.

Os órgãos de controle são enfáticos em demonstrar, por meio de relatórios de auditorias, inquéritos civis e criminais, vantagens para a população mato-grossense com a finalização do processo licitatório e contratação de empresas para exploração do serviço, inclusive, por serem eles, os usuários, que já pagam o imposto estadual que compõe o preço da passagem.

O Tribunal de Contas do Estado já constatou que as tarifas pagas pelos usuários às empresas, que não possuem contrato de concessão ou autorização legal, são mais caras que aquelas que serão praticadas com a conclusão do processo licitatório. Portanto, hoje, sem contrato, quem paga mais caro é o usuário.

Não bastando, no mesmo documento – Relatório de Auditoria Operacional no Sistema de Transporte Coletivo Rodoviário Intermunicipal de Passageiros do ano de 2017 – os técnicos do Tribunal de Contas do Estado estimaram a ocorrência de evasão no recolhimento de ICMS, para os anos de 2013 a 2016, de mais de R$ 108.000.000,00 (cento e oito milhões de reais).

O Ministério Público Estadual também já constatou prejuízos à população, em inquérito criminal, apontando que até o mês de março de 2018 algumas das empresas que exploram o sistema sem contrato ou autorização válida sonegaram, nada mais, nada menos que aproximadamente R$ 235.000.000,00 (duzentos e trinta e cinco milhões de reais).

Certamente outros desmandos são também responsáveis pela decretação de CALAMINADE FINANCEIRA no âmbito da Administração Pública Estadual.  Mas, pelos números, grita que regularizar o transporte intermunicipal de passageiros é necessário, urgente e imprescindível para incremento da arrecadação do Estado e assim, redução do déficit anunciado em 1,7 bilhões.

Grande passo na regularização dos contratos foi dado pela Secretaria de Infraestrutura e Logística que publicou no Diário Oficial do Estado do dia 07 de março de 2019, chamamento para contratação emergencial, com fundamento na manifesta necessidade de formalização de contratos para exploração do transporte intermunicipal de Mato Grosso.

Diante dos valores inseridos no contexto da precariedade que hoje vigora, parece claro que a calamidade financeira será superada com muito mais facilidade com a regularização do sistema de transporte intermunicipal, que se acelera com a contratação emergencial.

Os mato-grossenses ganharão não apenas com a possibilidade do aumento na arrecadação e destinação de recursos para a saúde, segurança, educação. Ganharão, como já constatado pelos órgãos de controle, com a redução dos valores das tarifas. Ganharão com a existência de um contrato que trará obrigações claras e penalidades possíveis, permitindo regulação clara e melhora na prestação dos serviços.

A contratação emergencial deve aliviar a calamidade financeira e da exploração do transporte intermunicipal. Mas a continuidade do processo licitatório, até formalização dos contratos de concessões, ao que se espera, é que resolverá. No fim, o cidadão mato-grossense certamente agradecerá!

ROMÉLIA RIBEIRO PERON é advogada e servidora pública.

 

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