Riscos ambientais são ignorados e desmatamento é realizado em APA

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Maquinários já estariam sendo instalados para entrar em atividade em quatro áreas dentro da Área de Preservação Ambiental (APA) das Cabeceiras do Cuiabá, localizadas em duas propriedades no município de Rosário Oeste.

A exploração nessas áreas está amparada pela Lei Estadual nº 10.713/2018, que permite novos desmatamentos nesta unidade de conservação que permite uso, ou seja, de Uso Sustentável. A Secretaria de Estado de Meio Ambiente (SEMA) confirmou que emitiu autorizações de desmate nas propriedades São Miguel Arcanjo e Boa Esperança, respeitando assim o princípio da legalidade.

Em contrapartida, o Ministério Público Federal (MPF) entrou, ainda em 2018, com uma liminar suspendendo temporariamente o dever do Estado de abster-se em conceder qualquer autorização de desmatamento no interior da APA. Para o órgão, essa prática é considera inconstitucional “dentre outros motivos, por ofender o princípio da precaução, comprometer os atributos que justificaram a criação da unidade de conservação e consagrar intolerável retrocesso ambiental”. Mas a proibição obtida pelo MPF foi revogada por decisão judicial em instância superior, com liberação de desmate de mais três mil hectares pela SEMA.

A alteração na lei é criticada por ambientalistas e pesquisadores de organizações que integram o Fórum Mato-grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Formad) que temem uma escalada na degradação, em especial para ampliar a área de produção de grãos, com danos irreversíveis para toda a Bacia do Cuiabá e Pantanal a jusante, tanto na quantidade quanto na qualidade da água que abastece Rosário Oeste e a região metropolitana de Cuiabá.

Uma nota técnica da ONG Instituto Centro de Vida (ICV) alerta sobre os riscos da aprovação da lei. Imagens de satélite mostram que até 2016, cerca de 180 mil hectares – quase 40% da área total – foram derrubados para abertura de pastagens e lavouras de milho e soja.

“A proposta de alteração da lei permitindo novos desmatamentos na área da APA abre a possibilidade de realização de desmatamentos de forma legal em quase 100 mil hectares dessa Unidade de Conservação que hoje estão sob proteção legal”, aponta trecho de uma nota técnica assinada pelo ICV e outras cinco entidades.

Para a conselheira da APA das Cabeceiras do Rio Cuiabá, representante da sociedade civil como FONASC, e professora do Instituto de Saúde Coletiva da UFMT, Dra. Débora Calheiros, a alteração na lei gera uma insegurança hídrica. Ela explica que é primordial se ter o Plano de Manejo para embasar a tomada de decisão sobre qualquer ação ou atividade a ser executada na área da APA. Contudo, ressalta que nenhuma das APAs têm este Plano de Manejo elaborado e nem sequer aprovado pelos seus respectivos Conselhos Gestores.

“Uma vez que esta tendência de autorização de novos desmatamentos se instale e continue, a oferta de água para a população atual e futura ao longo do Rio Cuiabá e para manter a biodiversidade do Pantanal será gradativamente comprometida, inclusive pela contaminação por agrotóxicos, com malefícios à saúde humana e ambiental sabidamente conhecidos”, assegura.

A SEMA informou que as autorizações também condicionaram o desmatamento à realização da exploração observando os limites do projeto e que quaisquer alterações devem ser comunicadas ao órgão. “O parecer técnico informa ainda que as árvores remanescentes, porta sementes e espécies ameaçadas ou vulneráveis à extinção não poderão ser cortadas”, esclareceu.

A APA possui 473.411 hectares e está localizada no centro-sul do estado, região que combina parte da bacia do Teles Pires e do Juruena, ambas amazônicas, e a sub-bacia do Alto Cuiabá, que compõe a bacia do Alto Paraguai, formadora do Pantanal. A APA cabeceiras do Cuiabá e as outras APAs da região, Como a APA da Chapada dos Guimarães, A APA do Casca e a do Arica, bom como o Parque Estadual Águas do Cuiabá e o Parque Nacional da Chapada dos Guimarães são unidades de conservação consideradas prioritárias para o futuro dos rios que formam o Pantanal e para garantir a água para a população rio abaixo.

Débora Calheiros lembra que as previsões de mudanças climáticas para a região indicam aumento da frequência de eventos extremos de chuva, mas também secas pronunciadas. A cobertura florestal nativa e a conservação das áreas de recarga para a água subterrânea são fundamentais para garantir água para o Rio Cuiabá. “Devemos colocar tudo isso na balança e pensar: vale a pena? Vamos arriscar?”, pondera.

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